O orçamento cada vez mais apertado trouxe novos
hábitos para a vida da consultora de beleza Karen Lima Piasentim. Com a renda
em queda, ela trocou o antigo hobby de comprar sapatos por uma nova mania:
colecionar tabloides de liquidação e traçar estratégias para conseguir comprar
ao menor preço possível. A ideia é mapear os trabalhos fora de casa e os
supermercados que estão na mesma rota. "Assim, consigo comprar o produto
mais barato e não gasto combustível", conta a consumidora, que também virou
visitante assídua de sites de desconto.
O malabarismo feito por Karen tem sido rotina para
grande parte das famílias que viram os gastos extrapolarem a renda de 2014 pra
cá. Em dois anos, o poder de compra da população brasileira - um cálculo que
leva em conta a renda do mercado de trabalho, a renda da previdência, o
crédito, os juros e a inflação - caiu de R$ 3,49 trilhões para R$ 3,17
trilhões, queda de 9,1% chegando ao menor patamar desde 2011, segundo a
Tendências Consultoria Integrada. Na prática, significa dizer que a população
está mais pobre, sem condições para aumentar consumo nem fazer poupança.
Neste ano, segundo o economista João Morais, autor
do levantamento, o principal limitador do poder de compra das famílias
brasileiras foi o mercado de trabalho. Em dois anos, a taxa de desemprego do
País saltou de 5% para 11,6%. Junta-se a isso o aumento dos juros e a escalada
dos índices de preços ao consumidor, que corroeram a renda do brasileiro (algo
em torno de 24% de 2014 pra cá).
No dia a dia, o efeito desse conjunto de taxas e
cifras é a sensação de que o mesmo salário não dá conta das mesmas despesas do
passado. "Tivemos dois anos de inflação alta e reajustes salariais abaixo
dos índices", lembra Morais.
Para encaixar as despesas ao orçamento, os
consumidores cortam quantidades, trocam marcas, eliminam produtos considerados
não essenciais e mudam hábitos. Só neste ano, o consumo de combustíveis caiu
4,44%; o de energia elétrica, 1,25%; e a venda de veículos novos recuou 22,8%.
"Temos percebido uma mudança no padrão de consumo dos brasileiros, que
passaram a racionalizar até na alimentação", afirma Christine Pereira,
diretora comercial da Kantar Worldpanel, que consulta 11,3 mil lares no Brasil
inteiro.
Segundo ela, esse movimento se reflete em marcas
mais populares e no aumento das idas ao supermercado em busca de promoções.
"As famílias estão fazendo malabarismo. Mesmo nas promoções, para comprar
algum produto ‘premium’, só com uma marca mais popular", diz a executiva.
Karen confirma a tese de Christine. "Antes tinha preconceito com algumas
marcas. Hoje experimento coisas que não conheço."
Novo
Jornal