José Aldenir / Agora RN |
Há 78 dias, o petróleo cru encontrado na
costa brasileira ainda era chamado de “substância escura e oleosa”. O que
poderia parecer inicialmente um caso isolado se mostrou, contudo, uma das
maiores tragédias ambientais do País, atingindo desde então quase 600
localidades do Nordeste e do Espírito Santo.
O óleo chegou a praias, ilhas, manguezais, rios e Áreas de Proteção
Permanentes (APPs) em grandes manchas ou fragmentos. Em alguns lugares, foi
encontrado mais de uma vez, inclusive em pontos que estavam praticamente
limpos, como a Praia de Itapuama, uma das mais afetadas em Pernambuco.
Os casos mais recentes são de vestígios, menores ou do tamanho da
palma da mão, mas também impactantes para as comunidades locais, como a
capixaba Praia de Regência, atingida há quatro anos pela lama da barragem de
Mariana. O encontro do óleo e da lama também se repetiu em Abrolhos, na Bahia,
que reúne a maior biodiversidade marinha do Atlântico Sul.
A retirada começa de forma improvisada, pela população local e até
por turistas, e depois conta com diferentes esferas governamentais. Com o
avanço do óleo por destinos turísticos do Nordeste, a gestão Jair Bolsonaro foi
pressionada a intensificar a resposta. O ministro do Meio Ambiente, Ricardo
Salles, negou demora na reação ao desastre e o governo enviou militares às
praias para ajudar na limpeza.
Em vários pontos, a maior parte da força-tarefa é de voluntários,
muitas vezes sem equipamento adequado para evitar o contato direto com a
substância. “Não era para voluntários terem contato com o resíduo nas praias. É
só pegar o exemplo de outros países. Mas imagina o pescador, que tem no mar a
fonte de renda, vendo que está chegando o piche”, afirma Sidney Marcelino
Leite, coordenador do movimento Salve Maracaípe.
Com a menor concentração de óleo em alguns Estados e o relato de
contaminação ao contato com óleo, ONGs têm visto menos voluntários e até tentam
emplacar convocações como “o óleo não acabou” e “cadê vocês?”. “O grosso (do
óleo) parou de chegar, as pessoas acham que está tudo bem e cai o número de
voluntários. Ainda vem bastante gente no fim de semana. Agora, o processo é
mais minucioso, como o de tirar das pedras”, diz Leite.
Investigação
Até agora, a Polícia Federal não tem uma explicação definitiva
sobre a origem e a causa do derramamento. Bolsonaro afirmou que o óleo tem “DNA
da Venezuela”, mas não há provas de que o país vizinho tenha relação direta com
o vazamento, que teria começado em meados de julho até atingir, em agosto, o
litoral do País.
Entre as hipóteses estão o derramamento por um navio que teria
passado pela área ou, até mesmo, afundado. Segundo a PF, o navio grego
Bouboulina é o principal suspeito, mas a empresa proprietária nega e
especialistas têm questionado os indícios do governo. Outras questões seguem
sem resposta, como o impacto no pescado. Embora o governo federal considere
seguro o consumo, a pesquisa usada como base era inicial e teve anúncio
contestado até por um dos cientistas responsáveis (por envolver produto da
pesca industrial, minoria na região).
A maior parte dos esforços científicos vem de universidades
federais, organizadas individualmente ou em rede do Norte ao Sul do Brasil. “O
trabalho de pesquisadores e voluntários é desenvolvido em rede com outros
Estados. Umas são formais, como as dos institutos, e outras informais”, conta
Jailson Bittencourt de Andrade, do Centro Interdisciplinar de Energia da
Federal da Bahia (UFBA) e vice-presidente regional da Associação Brasileira de
Ciências.
As pesquisas buscam soluções para questões emergenciais, mas devem
se prolongar. “Os efeitos não vão cessar de imediato. É preciso alguns anos
para investigar as consequências no ambiente e nos organismos”, diz Emerson
Soares, coordenador da força-tarefa da Federal de Alagoas (Ufal), que reúne 22
professores e cerca de 80 alunos de graduação e pós. Pesquisadores estimam que
serão precisos de 10 a 20 anos para acabar com os efeitos nocivos do óleo.
Também são desconhecidos os efeitos no turismo. Segundo a
Associação Brasileira da Indústria de Hotéis potiguar, não houve cancelamentos
expressivos de reservas e o impacto deverá ser conhecido no início de dezembro,
quando dados da ocupação hoteleira do último trimestre são tabulados.
Destino
No Sudeste, Estados e Prefeituras têm feito treinamentos diante da
possível chegada do óleo. Segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
(Inpe), correntes marinhas podem levar o material até o norte fluminense, mas
uma proteção natural dificulta a passagem ao sul de Cabo Frio. As informações
são do jornal O Estado de S. Paulo.
Agência Estado