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Professor
de epidemiologia da Escola de Saúde Pública da Universidade de Michigan (EUA),
Arnold Monto é considerado um dos maiores especialistas do mundo em coronavírus. Ele trabalhou em Pequim
durante a epidemia da Síndrome Respiratória Aguda Grave (Sars, na sigla em
inglês), entre 2002 e 2003, e já trabalhou também como consultor da Organização Mundial de Saúde (OMS).
Em entrevista ao Estado por
telefone, Monto afirmou que o atual surto do novo coronavírus surgido na China "ainda vai piorar
antes de começar a melhorar". Segundo o especialista, o vírus deve se
espalhar por vários países - já houve confirmação de infectados em pelo menos
15 nações. Ele acredita, no entanto, que a nova epidemia não deverá ser tão
devastadora quanto a de Sars, há 17 anos, quando cerca de 800 pessoas morreram
em todo o mundo. Leia a entrevista:
Faz 17 anos que outro coronavírus, causador da Síndrome Respiratória
Aguda Grave (Sars), surgiu na China, deflagrando uma epidemia mundial que
contaminou 8 mil pessoas e matou cerca de 800. Qual a perspectiva para este
novo coronavírus?
Provavelmente não será tão
devastador. Mas ainda vai piorar antes de começar a melhorar. A boa notícia é
que depois da experiência com a Sars, já sabemos o que deve ser feito em termos
de medidas de saúde pública, como isolamento e quarentena, uma vez que também
não há vacina nem remédio contra o vírus. No entanto, hoje, temos muito mais
viagens internacionais do que tínhamos em 2003, o que facilita a disseminação
da doença. Provavelmente vamos continuar tendo novos casos em diferentes países
e, certamente, em todas as grandes cidades da China.
Houve mais casos sendo registrados agora, nos primeiros dias desta
epidemia, do que no início do surto de Sars, em 2003. Isso é indicativo de uma
transmissão mais rápida?
Não necessariamente. Em
2003 só conseguíamos identificar os casos mais graves. Agora, conseguimos
identificar também os casos mais brandos. A tendência é que os números aumentem
mesmo.
O senhor acha, então, que é praticamente impossível impedir que os casos
cheguem em nossos países?
Acho que vamos ter o
registro de muitos casos saindo da China por um bom tempo. Mas se tivermos o
cuidado de impedir muitas transmissões dentro dos nossos países, conseguiremos
controlar a propagação do vírus. Identificar casos suspeitos e tratar casos
potenciais é o caminho. Essa é a minha previsão.
O senhor mencionou medidas de saúde pública para conter a transmissão,
como a quarentena. Numa medida que não era vista há pelo menos um século, a
China isolou Wuhan, uma cidade de 11 milhões de habitantes. No entanto, isso
parece não ter funcionado....
Infelizmente não foi cedo o
suficiente. O vírus já se espalhou para as grandes áreas do país.
Em princípio, a taxa de letalidade do novo coronavírus é de 3%, mais
baixa que a da gripe. Por que está todo mundo tão preocupado?
Não sabemos ao certo se a
taxa de letalidade é essa. Como eu disse, diferentemente do que aconteceu na
Sars, quando só foram diagnosticados os casos mais graves, desta vez estamos
pegando também os menos graves (o que pode alterar significativamente a taxa de
letalidade). Como no caso da influenza, os mais velhos e com baixa imunidade
são mais vulneráveis. Mesmo a taxa de letalidade não sendo muito alta, queremos
evitar que o vírus se espalhe e muita gente fique doente. Se isso acontecer, o
número de mortes pode ser muito alto. Só na China tem mais de um bilhão de
pessoas. Uma outra questão em relação à gripe é que, em princípio, o novo
coronavírus pode ser transmitido muito antes de os primeiros sintomas
aparecerem e o período de incubação parece ser bem maior (o que facilitaria a
disseminação). Acho que dentro de poucos dias teremos isso mais bem
estabelecido pelos chineses. Mas não é caso de entrarmos em pânico.
A grande maioria dos novos vírus respiratórios surge na China. E já
está bem estabelecido que isso acontece por conta da forma como os chineses
criam animais (em conjunto e em espaços confinados) e os comercializam. Nada
pode ser feito sobre isso?
Sim, enquanto essa situação (do
confinamento de animais) continuar, vamos ter casos assim. É
parte de um problema social. Há muitas questões sobre as comidas e as formas de
lidar com os animais com as quais os chineses terão que lidar. Vai ser
interessante observar esse movimento.
Estadão