Dados inéditos sobre a venda de munições
no país apontam que os atiradores civis compraram em 2019, pela 1ª vez, a mesma
quantidade que as forças de segurança pública: pelo menos 32 milhões de
projéteis.
O levantamento foi feito via Lei de Acesso à Informação pelo
Instituto Sou da Paz, e publicado pelo jornal O Globo neste domingo
(2.fev.2020).
No ano passado, civis foram destinatários de vários decretos do
presidente Jair Bolsonaro com flexibilização de regras para adquirir armas e
munições. Segundo os dados obtidos pelo Globo, o volume comprado
pelo grupo ainda superou em 143% o quantitativo de munições que o Exército
informou ter adquirido (13,2 milhões) no ano passado.
De 2018 a 2019, as compras diretas dos atiradores subiram 17,2%,
enquanto o número de projéteis adquiridos pelos órgãos de segurança pública,
incluindo as secretarias de gestão prisional, caiu 14,8%.
Clubes de tiro, federações e confederações também compraram mais no
ano passado em relação ao anterior: o volume subiu 30%, de 2 milhões para 2,6
milhões de munições.
A reportagem destaca
que a explosão na aquisição de munições por parte dos atiradores acende 1
alerta: o material adquirido pelo grupo não tem qualquer marcação de lote
inscrito no cartucho. É com esse dado que investigadores podem rastrear a
origem de projéteis encontrados em cenas de crime. Serve também para evitar e
apurar desvios.
Pela lei, somente munições usadas pelas
forças de segurança pública e pelas Forças Armadas precisam ser marcadas. Essa
parcela, no entanto, representa apenas 22% do que foi colocado em circulação no
país ano passado. Em 2018, esse índice era de 27%.
Em nota, o Exército informou que há estudos em andamento para
ampliar a obrigatoriedade de uso de munições marcadas e que “o
aumento crescente de munições compradas pelos atiradores, que não têm marcação
de lote no cartucho, não traz riscos para a segurança pública, tendo em vista
que, para serem atiradores registrados no Exército, é necessário ter idoneidade
comprovada no processo de registro.”
O Presidente da Associação CAC Brasil (Caçadores, Atiradores e
Colecionadores do Brasil), Marcelo Midaglia Resende, afirma que o grupo usa
muita munição porque faz treinos intensivos —ao menos os que atuam como atletas
de alto rendimento, que ele calcula em 35% do total.
“Tem policial que em 30 anos não deu 1
disparo, enquanto o CAC precisa treinar sempre. Para ter determinadas autorizações
no Exército, o atirador tem que comprovar que praticou ao menos 8 vezes no ano”.
Daniel Cerqueira, pesquisador do Ipea (Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada) na área de segurança, diz que os decretos de Bolsonaro
sobre armas —ao menos 8 ao longo de 2019, dos quais 4 estão em vigor— têm
relação com o aumento de munições colocadas em circulação no país.
“Sem contar o risco de essas armas e
munições que vão se proliferar caírem, no futuro, no mercado ilegal. Estudos
mostram que boa parte das armas legais acabaram nas mãos de criminosos porque
são furtadas, roubadas”, explica.
Poder 360